quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

A causa-raíz é a enfermeira?

Ontem recebemos o comentário abaixo do Hiroaki sobre o post Hospitais sem sofrimentos:

"Hiroaki disse...
Vocês leram sobre uma morte porque uma enfermeira injetou glicerina numa criança em vez de soro? Os dois vidros iguais! O erro foi da enfermeira, mas cadê o 5S? Why? Why? Why?
Falta muito nos hospitais!"

Achei tão pertinente o comentário que resolvi escrever um post.
Pra quem não sabe do caso, veja no link: http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/sp/mp+abre+inquerito+para+apurar+morte+de+menina+em+sao+paulo/n1237859947197.html

Nada do for feito vai trazer a vida da Stéphanie de volta. Nada. Qualquer análise que for feita não vai diminuir a dor que a família dela, especialmente os pais, estão sentindo nesse momento. Só nos resta mesmo é orar para que o sofrimento passe, para que o tempo cure um pouco as feridas.

O que chama a atenção no caso é que nas notícias que circulam, em entrevistas que ouço nas rádios, em nenhum desses veículos, ouvimos alguém questionar o por quê do problema ter acontecido. Hoje pela manhã, ouvi uma série de entrevistas na Jovem Pan e o foco era único:

- "vamos indiciar a enfermeira que é a grande culpada pela morte da menina"
- "a enfermeira não estava preparada. É preciso rever as instituições de enfermagem."
- "precisamos de mais rigor para formar profissionais para a área de saúde"

Claro que a enfermeira tem uma parcela de culpa e merece ser julgada pelo que fez. Concordo também que existe uma grande chance de existir um problema de educação, agora, culpar a enfermeira e as instituições de ensino irá resolver todos os problemas do hospital? Tenho absoluta convicção que não. Pra começar, dois exercícios de 5 Porquês precisariam ser feitos:

1 - causas da não detecção - Por que a enfermeira não pôde distinguir a diferença entre soro e vaselina líquida?
5PQs, não apenas 1!!
Problema da embalagem é o primeiro porquê apenas! De novo, mudar a cor dos frascos vai resolver de vez o problema de não-detecção?

2 - causas da ocorrência - Por que houve a confusão com os frascos? É só pq a enfermeira não prestou atenção ou não era capacitada?
5PQs, não apenas 1!!
Reitero que sim, o erro da enfermeira é um problema, mas está longe de ser a causa-raíz dessa fatalidade. Podemos perguntar: como é a organização dos hospital (5S)? Como os insumos são armazenados? Como são controlados? Como são descritos os procedimentos operacionais no hospital? Existem sistemas à prova de erros (Poka-Yoke)? Etc, etc, etc... Se o processo é ruim, só pode gerar resultados ruins.

Concordo plenamento com o comentário do Hiroaki: 5 PQs ajudaria muito nesse caso! Apenas duvido que será foco em algum momento. Por se tratar de um caso que veio ao conhecimento da opinião pública, antes de alguém pensar em perguntar 5 vezes Por Que, outro alguém vai exigir (e já estão), o 1 Quem.

6 comentários:

  1. Concordo plenamente. Ao invés de procurar a causa-raiz, procura-se o culpado.

    Ao invés dos '5-Why', fazemos os '5-who'... Ao invés do 'brainstorm', fazemos o 'blamestorm'. Isso acontece inclusive nas melhores empresas.

    Abs,
    Thales

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    1. Fantástico o Blame Storm, nunca tinha escutado essa....

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  2. É sempre o mesmo problema:
    1. reação em vez de prevenção
    2. busca de culpados e não de causas
    3. foco nas pessoas em vez de nos processos
    4. omissão por parte dos responsáveis. Um dos princípios da Qualidade na ISO 9000 é: "responsabilidade da gerência".
    Apenas para citar alguns...
    Penso que se no ambiente fabril, que está mais exposto aos conceitos modernos de qualidade e produtividade, ainda temos muito espaço para melhorias, nos demais ambientes estamos a anos-luz do ideal.

    Abraços

    Adilson Ahvener

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  3. Me parece que nos US existe alguma padronização para remédios que justamente visa impedir trocas infelizes.

    No fundo o maior problema está no que o Luciano escreveu acima: Processos ruins produzem resultados ruins. A pressão atual evita que o problema ocorra apenas por algum tempo, mas não para sempre. O raio voltará a cair no mesmo lugar!

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  4. Penso também na pobre enfermeira, quanto sentimento de culpa ela terá de carregar. Acho que é preciso mais que metodologias num problema tão complexo como esse. É preciso uma boa estratégia. Citei o IHI antes e volto a citá-los. Há uma campanha de qualidade para salvar 5 milhões de vidas: http://www.ihi.org/IHI/Programs/Campaign/Campaign.htm?TabId=0
    Eles chamam de Spreading Improvement Strategy.
    As estratégias são (definidas após profunda análise):
    -Time de resposta rápida
    -Prevenção de infecção do centro cirúrgico
    -Prevenção de pneumonia associada à ventilação mecânica (PAV)
    -Prevenção de infecção associada à inserção de cateter venoso central (CVC)
    -Cuidado avançado para infarto do miocárdio
    -Prevenção de úlceras por pressão
    -Reconciliação medicamentosa
    -Prevenção de tromboembolismo venoso
    -Prevenção de danos com medicação de alerta
    -Redução de complicações cirúrgicas
    -Reduzir infecção pela bactéria Stafilo Aureus multiresistentes
    -Alta administração envolvendo todos os passos
    -Cuidados avançados para paciente com insuficiência cardíaca congestiva

    Essa campanha parece estar valendo por aqui vejam essa notícia:
    http://www.saudebusinessweb.com.br/noticias/index.asp?cod=71793

    Abraço
    Roberto

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  5. No fundo, faltam coisas básicas. É bom saber que existem processos sérios por aí, mas ainda vamos ter que "sofrer" um pouco até colher os frutos.

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