quarta-feira, 27 de abril de 2011

Como a variabilidade afeta o Trabalho Padrão

Essa semana estou trabalhando na minha terra natal, na maior cidade da América Latina, em São Paulo. Pra evitar o stress de dirigir no trânsito dessa cidade, venho utilizando um meio de transporte que cresceu muito nos últimos anos e que se tornou uma grande opção para aqueles que vivem no interior e trabalham na capital, como no meu caso: o ônibus fretado.


Além da vantagem do conforto, tem a vantagem de nos manter pontuais, pois temos que sair no horário para tomar o ônibus. Como não trabalho sempre aqui, sou o que os organizadores desse sistema de transporte chamam de usuário avulso, ou seja, eu pago um valor para cada viagem, ao invés de fechar um pacote mensal. Pra mim compensa muito pois são apenas 4 dias de trabalho por aqui.

Os horários combinados parecem europeus: saímos 5h28, trocamos de ônibus 5h43 e chegamos às 7h13. E o pior é que eles acontecem na prática. Entendo que isso só é possível em virtude de um padrão de trabalho muito bem definido. Agora, o que acontece quando existe uma variabilidade em um processo como esse? Nada muito diferente do que acontece em fábricas e escritórios: o resultado é afetado, ações emergencias precisam ser tomadas e tudo isso impacta em tempo e custo, necessariamente!

Pra entenderem o caso, a variabilidade no processo em questão sou eu mesmo. Por eu ser um usuário avulso, o motorista do ônibus não está esperando a minha presença, ele está acostumado apenas com os usuários regulares. Dentro de sua rotina, quando um usuário regular não vai usar o ônibus, o motorista se dá a opção de mudar a rota definida no seu Trabalho Padrão, achando assim que vai ganhar um pouco de tempo no processo. O que aconteceu comigo então hoje, quando um usuário regular não subiu no ônibus e eu esperava-o dentro de sua rota padrão? Fui esquecido no ponto!

Pelo simples fato de o motorista não seguir o seu Trabalho Padrão, vejam o que ocorreu e como isso impacta em tempo e custo:

- liguei para o organizador do fretado e informei o ocorrido ($$ da ligação);
- ele verificou o que ocorreu e prontamente foi me buscar, usando seu carro ($$ de combustível);
- no caminho ele me ligou para perguntar onde eu estava ($$ da ligação);
- ele me pegou e fomos de encontro a um outro ônibus, que não ia exatamente para onde queríamos, mas que chegaria bem próximo;
- para alcançar o ônibus, regras de trânsito foram ignoradas (velocidade, semáforos) e inclusive uma multa de avanço no sinal vermelho foi premiada ($$ de multa + risco de segurança);
- ao chegarmos em SP, tivemos que tomar um trem para chegarmos em nosso destino final, no meu caso, com 30 minutos de atraso frente ao processo original ($$ do trem + atraso).

É um caso muito simples, mas que ilustra muito bem como uma variabilidade pode afetar o Trabalho Padrão e quais são os efeitos disso. Claro que se trata de uma situação da vida cotidiana, mas tenho certeza que não há diferença entre o caso ilustrado e qualquer outra variabilidade x não seguimento do trabalho Padrão em fábricas e escritórios.

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Handoff pode ser um grande problema!

Segundo o Wikipedia, handoff é o procedimento empregado em redes sem fio para tratar a transição de uma unidade móvel (UM) de uma célula para outra de forma transparente ao utilizador. Usamos também esse termo em Processos Administrativos. Chamamos de handoff toda a transferência de conhecimento, ou seja, toda vez que uma informação é passada de uma pessoa para outra, existe o chamado handoff. Ele está presente, por exemplo, em um simples e-mail.

Por que ele pode ser um grande problema? Vamos ver um caso onde o handoff está presente e o que pode ocorrer.

Hospitais. Infelizmente eu já tive de passar noites em hospitais e pude presenciar trocas de turnos entre os médicos. O que normalmente vemos são médicos com lápis e pequenos pedaços de papel, que se tornam então anotações sobre o estado de saúde das pessoas que permanecem no hospital. Imaginem o que vira esse pedaço de papel ao longo do turno de trabalho de um médico de plantão. Outras anotações, amassados, rasuras... tem todos os ingredientes para dar errado. Um médico americano cita:

It was probably more luck than smarts that saved me from making any major mistakes through my own imperfect handoffs. (Provavelmente mais sorte que juízo me salvaram de erros pelos meus handoffs imperfeitos)
Esses handoffs podem levar a exames redundantes, internações prolongadas desnecessárias ou falta de medicação adequada e tudo isso contribui muito para baixar o nível de qualidade do hospital, a satisfação dos pacientes e elevar os custos internos.



Agora... e nas empresas, é diferente? As trocas de turnos na produção, tem hadoffs? E nos escritórios então? A resposta é uma só: muito!!! E se há muito handoff, há chance de haver problema!

A notícia triste porém é que o handoff é praticamente impossível de ser eliminado. Primeiramente devido à falta de tempo. Não conseguimos fazer todo um processo de importação, por exemplo, sozinhos. Em segundo lugar, devido a falta de capacidade. Dificilmente uma pessoa terá todo o conhecimento necessário para exportar um material, por exemplo.

Se é impossível de eliminar, a boa notícia é que podemos minimizar seu efeito e a maneira mais fácil de fazê-lo é através da padronização. Um dos recursos de padronização que pode ser adotado é o bom e velho check-list. Muito usado na indústria nuclear, onde a troca de informações entre turnos é de vital importância para garantir que todos literalmente sobrevivam à jornada de trabalho, o check-list traz a transferência de conhecimento de forma padronizada, evitando excessos e faltas de informações, minimizando o efeito do handoff.

Outra forma de padronização, que vem sendo adotada em hospitais, vem sendo feita pela Gestão Visual. Um imã colorido colado na cama do paciente indica, por exemplo, o tipo de alimentação recomendada para casos de diabetes, problemas cardíacos, etc.

Check-list, Gestão Visual... Aos poucos os processos administrativos vem se utilizando dessas técnicas para minimizar cada vez mais o efeito do handoff, que causa tantos desperdícios no cotidiano dos escritórios.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

O que atletas de alta performance podem ensinar aos escritórios Lean?

Os processos administrativos de um modo geral não são desenhados para serem excelentes. Em sua grande maioria, esses processos apresentam problemas semelhantes aos que encontramos em manufaturas: má qualidade, sobrecarga, desnivelamento e gestão sem foco. Tenho visto com frequência essas situações nas áreas administrativas.

O que será que podemos aprender com os atletas de alta performance que podemos aplicar nos escritórios em nosso cotidiano?

Pra ajudar a responder essa pergunta, vou citar dois atletas recentes e espetaculares: Usain Bolt e Rafael Nadal.

O primeiro, trata-se do atleta jamaicano, campeão olímpico dos 100 metros e 200 metros no atletismo, que deixou o mundo inteiro pasmo com a facilidade como ele demoliu os recordes mundiais dessas provas. Ao lado de Michael Phelps, foi o grande nome dos jogos Olímpicos de Pequim em 2008.


O segundo é outro fenômeno, atual número 1 do mundo no tênis, recordista de títulos de Masters 1000, recordista em números de semanas consecutivas no topo do ranking da Associação de Tenistas Profissionais e um dos raros tenistas que tem vantagem no confronto direto contra o tido como maior tenista da história, Roger Federer.

Sempre que faço treinamentos ou palestras sobre Lean aplicados em escritórios, o Lean Office, cito que um dos grandes problemas dos processos administrativos, como citei no início deste post, é a falta de foco na gestão. Pra ajudar a entender o ponto de vista, quantos processos administrativos tem indicadores de desempenho operacional claramente definidos e medidos? A resposta que normalmente escuto é o silêncio.
  
Entendo como indicadores de desempenho operacional aqueles que são monitorados pelo nível operacional da área e não os indicadores que são apresentados em reuniões de diretoria. São os indicadores que ajudam a monitorar o desempenho do processo de uma forma mais micro. Nas manufaturas são comuns: quadros de controle de produção hora-a-hora, quadros de monitoramento da qualidade hora-a-hora, quadros Kanban, etc. Todos para auxiliar a gestão da manufatura, com foco em indicadores de desempenho operacionais. São raros os processos administrativos que possuem indicadores deste tipo, de desempenho operacional.

Qual é a relação com o Usain Bolt e o Rafael Nadal? Basta analisarmos como foi e é feita a preparação desses atletas.
  
O Usain Bolt, em sua preparação para as olimpíadas, filmava seus treinos. Baseado no seu indicador de desempenho operacional (tempo), que era controlado em intervalos de 10 metros, ele conseguiu descobrir que o seu ponto fraco, ou seja, a parte da corrida onde ele tinha o pior desempenho, era a largada. Com isso em mente, uma análise bem detalhada era focada então em sua largada e melhorias podiam então ser implementadas para garantir um melhor desempenho. Usain e sua comissão técnica passaram então a treinar exaustivamente todas as etapas da largada: posição “Nas suas marcas”, Posição de “preparar”, disparo, onde sua perna esquerda move-se ligeiramente a frente da sua mão direita e as três primeiras passadas.

O resultado de tudo isso ficou explícito quando Bolt quebrou o recorde dos 200 metros e disse: “Não estava pensando no recorde mundial. Eu estava trabalhando na minha largada durante toda a temporada e hoje eu acertei.”

Trata-se de gestão com foco! Indicador de desempenho correto e ações focadas!

Com o Rafael Nadal foi o mesmo. Para atingir o status de número 1 do mundo, Nadal trabalhou forte em seus pontos fracos, baseado nos indicadores de desempenho operacionais. No início da carreira, o Nadal perdia a maioria dos pontos que disputava em seu backhand. Outro ponto levantado foi o seu saque. O Nadal pouco acertava os primeiros saques, consequentemente enfrentava dificuldades quando jogava com os atletas do topo do ranking. Ações foram então tomadas para que esses pontos fracos melhorassem. Hoje ele tem um backhand potente, vencedor e um primeiro saque muito técnico e mais forte, o que gerou resultados positivos.

Medir sempre o desempenho e tomar ações para melhoria quando e onde necessário, gerenciando de maneira contínua pra manter o nível de excelência! Essas são grandes lições que podemos aprender com esses campeões que podem transformar os resultados nos processos administrativos!

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Playcenter, um center de manutenção urgente!

Domingo o Playcenter viveu mais um dia trágico em sua história quando oito pessoas ficaram feridas, sendo que três ainda estão na UTI, após uma falha no sistema de segurança de uma de suas atrações, o Double Shock. Segue o link com a matéria pra quem não ficou sabendo.


http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/sp/acidente+em+brinquedo+do+playcenter+em+sao+paulo+faz+8+feridos/n1300023461387.html

Desta vez os técnicos do Núcleo de Engenharia do Instituto de Criminalística da Polícia Técnico-Científica de São Paulo parecem não estar preocupados em achar um culpado ou responsável pelo acidente, mas estão sim preocupados em encontrar a causa-raíz que originou o problema. Bem diferente da postura adotada pelas autoridades do caso do post "A causa-raíz é a enfermeira?".

Uma fato que chama a atenção é que o intervalo entre falhas no Playcenter estar diminuindo, ou seja, os equipamentos apresentam problemas com mais frequência, e os problemas estão gerando acidentes graves! Vejam que em Setembro de 2010 houve um outro acidente no Playcenter.

http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/acidente+no+playcenter+fere+16+pessoas/n1237782985512.html

Uma triste constatação é que praticamente nada está sendo feito de maneira sistêmica para resolver de vez os problemas no parque. Não consigo acreditar que tenham sido fatalidades. Acredito sim que foram falhas na gestão do sistema de manutenção do parque. Nesse ponto, o Lean TPM pode ajudar muito!

TPM é uma sigla cuja tradução inicial era Manutenção Produtiva Total, passando para Gestão da Produtividade Total até chegar no termo mais recente, Gestão da Performance Total. O TPM ensina a enxergar a situação atual em relação à condição ideal da máquina ou equipamento, para conhecer as perdas a serem eliminadas para então, eliminar o GAP entre ambas.

Para esses casos específicos do Playcenter, alguns sinais são claros de falta de gestão do sistema de manutenção. Vejam alguns relatos das vítimas e testemunhas:

"Não consigo entender como deixam funcionar um brinquedo sujeito a esse tipo de acidente. O equipamento teve problema no mesmo dia e ninguém fez nada. Poderiam ter evitado tudo isso. Não entendo. Essa imprudência ainda vai matar alguém"
"Foi uma bênção de Deus, poderia ter sido eu" - conta uma pessoa que tentou duas vezes ir no brinquedo, mas que ele esteve momentaneamente fechado para manutenção técnica.
Analisando essas informações, percebemos que existe sim uma preocupação com a manutenção dos equipamentos no Playcenter. Os funcionários até fazem uma parte do que chamamos de Manutenção Autônoma. Acontece que isso não vem se mostrando eficiente na prevenção de problemas.

A Manutenção Autônoma é o ponto inicial para garantir que o equipamento esteja sempre nas condições normais. Ela vai também alimentar os problemas que deverão ser analisados através de um estudo mais detalhado, com um entendimento completo do problema e suas causas, dentro do pilar de Melhorias Específicas, de modo a garantir que ações corretivas permanentes sejam tomadas. Ambos vão então alimentar as Manutenções Planejadas. Esse conjunto leva o equipamento à quebra zero!

Me pergunto se o que é verificado na Manutenção Autônoma e que demonstra problema, é analisado com detalhes em busca da causa-raíz, e é incluído nas Manutenções Planejadas dos equipamentos. Creio que não. Vide que no caso do Double Shock, o equipamento já esteve fechado anteriormente por problemas de manutenção e mesmo assim foi liberado, até que a falha se manifestou e gerou o acidente.

Em casos como o de domingo, o equipamento deveria ter sido fechado até que o problema que se apresentou duas vezes fosse completamente entendido, analisado e resolvido. O Playcenter deveria rever seu sistema de gestão da manutenção dos equipamentos e o Lean TPM é uma opção excelente para evitar que casos como os de Setembro e de domingo voltem a ocorrer, deixando mais vítimas e manchando o nome do parque.

domingo, 3 de abril de 2011

Insatisfação na Construção Civil

Já repararam que em todo contrato de construção civil de habitação, existe uma cláusula que impede qualquer multa para a construtora se a obra atrasar até 6 meses? De fato, essa é uma prática comum no ramo da construção civil. Agora, o que isso significa para o consumidor final? E para a própria construtora? Quero explorar um pouco essa situação.

O simples fato de a cláusula existir já traz o primeiro desconforto ao cliente. Imagine você, comprando uma casa e recebendo a seguinte informação:

"Senhor, a previsão de entrega é para Maio, mas pode ser que fique para Novembro".
Do ponto de vista da empresa, a situação existe para evitar possíveis problemas legais no futuro. De fato é só isso? Eu acredito que inicialmente sim. Acredito que a idéia da cláusula seja mesmo para proteger as construtoras frente aos problemas que podem gerar atrasos na entrega das obras. Acredito também que, com o passar do tempo, os 6 meses de "segurança" hoje fazem parte do baseline do planejamento, isto é, é bem provável que a obra não seja entregue no prazo acordado, mas sim próximo ao limite de 6 meses, eventualmente até após.

Na verdade essa foi uma informação que recebi de algumas pessoas que trabalham nesse ramo. Essa "gordura" no cronograma é sempre considerada como tempo útil dentro do planejamento. Claro que o objetivo é sempre entregar a obra dentro do prazo acordado, porém se a obra atrasar dentro do prazo "permitido", ninguém se abala.

Acho que esse é o ponto que pode ser melhorado. Sei que desde o princípio o cliente está informado das condições de entrega, portanto, atrasos dentro do permitido não deveriam gerar grandes insatisfações aos clientes. Sem dúvida essa afirmação não é real. A expectativa do cliente é sempre de que o prazo será cumprido, independente de já saber das condições anteriormente.

Tenho dúvidas se isso é claro para as construtoras, pois é crescente o número de atrasos de entrega. Em SP, 60% das obras são entregues de 6 a 24 meses de atraso, conforme noticiado no Jornal da Globo de 18/10/2010.

http://g1.globo.com/jornal-da-globo/noticia/2010/10/atraso-na-entrega-de-obras-cresce-com-boom-imobiliario.html

Para piorar, já tive conhecimento de casos onde a famosa "parcela das chaves" foi cobrada sem a obra estar finalizada, apenas considerando o prazo planejado para entrega. Prato cheio para os advogados de plantão, que só elevam a quantidade de processos contra as construtoras.

Tive a oportunidade de aplicar conceitos Lean em uma construção em 2009, na construção de uma usina hidrelétrica no Sudão. Em 2 meses morando nesse peculiar país, pude constatar alguns problemas que devem ser idênticos aos do Brasil.

1 - falta de mão-de-obra qualificada
2 - planejamento bem feito, mas mal gerenciado
3 - nenhuma organização no local de trabalho resultando em falta de peças, espaço e ferramentas

Esse 3 problemas unidos levaram a obra a um atraso e multas ao cliente. Aplicando um pouco de Lean Construction, conseguimos mudar a tendência e reduzir muito o atraso. Com o mapeamento do fluxo de valor, conseguimos rever o planejamento e reduzir o tempo de montagem de alguns componentes da obra, que passou a ser gerenciada dia-a-dia no Gemba, com o auxílio da Gestão Visual.

O resultado foi muito bom! Houve uma redução no tempo de montagem e os atrasos foram também reduzidos.

A mensagem é que Lean na construção, que teve seu início em 1992, pode ser uma grande alternativa para as construtoras nacionais mudarem o cenário atual de atrasos e voltar a satisfazer seus clientes. Pra comprovar, vejam o exemplo da construção de um hotel na China em apenas 6 dias.